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24 de Abril de 2024

Responsabilidade civil do Estado por danos causados por agente público: ação de indenização e legitimidade passiva[1].

Publicado por Antonio Roberto Basso
há 4 anos


O Supremo Tribunal Federal – STF , em agosto de 2019, apreciando o tema 940 da repercussão geral (Recurso Extraordinário – RE 1027633[2]), fixou a seguinte tese: “A teor do disposto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público, sendo parte ilegítima para a ação o autor do ato, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

Embora tal julgado não tenha sido objeto de grande divulgação, é forçoso reconhecer que nele enfrentou-se importante tema sob a ótica da repercussão geral.

Há muito discute-se, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, sobre a possibilidade do agente público ser apontado como réu, isoladamente ou em litisconsórcio, com o ente ou entidade pública ao qual está vinculado, em ação de responsabilidade civil do Estado.

No Superior Tribunal de Justiça – STJ, firmou-se jurisprudência, em sentido contrário à tese agora estabelecida pelo STF, na linha de que "é faculdade do autor promover a demanda em face do servidor, do estado ou de ambos, no livre exercício do seu direito de ação", ou seja,(STJ, REsp 731.746/SE, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe de 04/05/2009).

No mesmo sentido:

RESPONSABILIDADE CIVIL. SENTENÇA PUBLICADA ERRONEAMENTE. CONDENAÇÃO DO ESTADO A MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INFORMAÇÃO EQUIVOCADA. AÇÃO INDENIZATÓRIA AJUIZADA EM FACE DA SERVENTUÁRIA. LEGITIMIDADE PASSIVA. DANO MORAL. PROCURADOR DO ESTADO. INEXISTÊNCIA. MERO DISSABOR. APLICAÇÃO, ADEMAIS, DO PRINCÍPIO DO DUTY TO MITIGATE THE LOSS. BOA-FÉ OBJETIVA. DEVER DE MITIGAR O PRÓPRIO DANO.

1. O art. 37, § 6º, da CF⁄1988 prevê uma garantia para o administrado de buscar a recomposição dos danos sofridos diretamente da pessoa jurídica que, em princípio, é mais solvente que o servidor, independentemente de demonstração de culpa do agente público. Vale dizer, a Constituição, nesse particular, simplesmente impõe ônus maior ao Estado decorrente do risco administrativo; não prevê, porém, uma demanda de curso forçado em face da Administração Pública quando o particular livremente dispõe do bônus contraposto.

Tampouco confere ao agente público imunidade de não ser demandado diretamente por seus atos, o qual, aliás, se ficar comprovado dolo ou culpa, responderá de outra forma, em regresso, perante a Administração.

2. Assim, há de se franquear ao particular a possibilidade de ajuizar a ação diretamente contra o servidor, suposto causador do dano, contra o Estado ou contra ambos, se assim desejar. A avaliação quanto ao ajuizamento da ação contra o servidor público ou contra o Estado deve ser decisão do suposto lesado. Se, por um lado, o particular abre mão do sistema de responsabilidade objetiva do Estado, por outro também não se sujeita ao regime de precatórios.

Doutrina e precedentes do STF e do STJ.

(…)

5. Recurso especial não provido"(STJ, REsp 1.325.862⁄PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe de 10⁄12⁄2013).

Espera-se, entretanto, que, em breve, o STJ passe a adotar o entendimento agora consolidado pelo STF no julgamento do RE 1027633.

Ao julgar o RE 1027633, sob a ótica da repercussão gera, o STF confirmou entendimento estabelecido pela Primeira Turma da Corte Suprema, ainda em 2006, quando do julgamento do RE 327904 , cujo acórdão foi assim ementado:

RE 327904 / SP - SÃO PAULO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator (a): Min. CARLOS BRITTO

Julgamento: 15/08/2006 Órgão Julgador: Primeira Turma

Publicação

DJ 08-09-2006 PP-00043 EMENT VOL-02246-03 PP-00454

RTJ VOL-00200-01 PP-00162

RNDJ v. 8, n. 86, 2007, p. 75-78

(...)

Ementa

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO: § 6º DO ART. 37 DA MAGNA CARTA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. AGENTE PÚBLICO (EX-PREFEITO). PRÁTICA DE ATO PRÓPRIO DA FUNÇÃO. DECRETO DE INTERVENÇÃO. O § 6º do artigo 37 da Magna Carta autoriza a proposição de que somente as pessoas jurídicas de direito público, ou as pessoas jurídicas de direito privado que prestem serviços públicos, é que poderão responder, objetivamente, pela reparação de danos a terceiros. Isto por ato ou omissão dos respectivos agentes, agindo estes na qualidade de agentes públicos, e não como pessoas comuns. Esse mesmo dispositivo constitucional consagra, ainda, dupla garantia: uma, em favor do particular, possibilitando-lhe ação indenizatória contra a pessoa jurídica de direito público, ou de direito privado que preste serviço público, dado que bem maior, praticamente certa, a possibilidade de pagamento do dano objetivamente sofrido. Outra garantia, no entanto, em prol do servidor estatal, que somente responde administrativa e civilmente perante a pessoa jurídica a cujo quadro funcional se vincular. Recurso extraordinário a que se nega provimento.

Decisão

A Turma conheceu do recurso extraordinário, mas lhe negou provimento. Unânime. Não participou, justificadamente, deste julgamento o Ministro Marco Aurélio. Falou pela recorrente o Dr. José Saraiva. 1ª. Turma, 15.08.2006.

O STF acertou em 2006 e manteve a precisão agora em 2019, sob a ótica da repercussão geral, ao fixar a tese de que a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público, considerando parte ilegítima para a ação o autor do ato, sem prejuízo do direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa grave.

Além de confirmar a importante garantia ao servidor público de somente responder administrativa e civilmente perante a pessoa jurídica a cujo quadro funcional se vincular, eximindo-o de ter de responder, por exemplo, ações judiciais propostas com notório intuito de vingança pessoal ou de amedrontamento do agente estatal, o STF decidiu com amparo na conhecida Teoria do Órgão, segundo a qual toda a ação do agente público deve ser imputada à pessoa jurídica a cujo quadro funcional ele se vincular.

A tese agora fixada pelo STF, ainda, vai ao encontro de outra norma protetiva do agente público, o art. 28[3] da Lei de Introdução às Normas do Direiro Brasileiro – LINDB, segundo o qual “O agente público responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro.”

Depreende-se, então, com a conjugação desse dispositivo legal com a nova tese fixada pelo STF, que o agente público, além de somente responder administrativa e civilmente perante a pessoa jurídica à qual ele esteja vinculado, só será responsabilizado, administrativamente ou em ação de regresso, em caso de dolo ou erro grosseiro.

Oportuntamente, para concluir, vale registrar, na trilha do que ensinam Floriano de Azevedo Marques Neto e Rafael Véras de Freitas[4], ao interpretarem o art. 28 da LINDB, que proteções da espécie desse dispositivo legal e da nova tese firmada pelo STF não impedem a coibição de comportamentos ímprobos ou desonestos, mas sim prestam a devida garantia ou deferência ao agente público honesto.

  1. Faz-se a presente publicação para cumprir exigência relativa à disciplina Servidor Público no curso de pós-graduação em Direito Administrativo do Instituto de Direito Bacellar.

  2. Acórdão ainda não publicado. O resultado do julgamento, não obstante, foi divulgado no Informativo STF nº 947 . Disponível em: (http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo947.htm (acesso em 04/12/2019).

  3. Artigo acrescentado à LINDB pela Lei 13.655/2018.

  4. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo; FREITAS, Rafael Véras de. Comentários à Lei 13.655/2018 (Lei da Segurança para a Inovação Pública). Belo Horizonte, Fórum, 2019.

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